Hello, Hello!
O uso de tecnologia tem um preceito básico: diminuir custos. E quando pensamos em custos, podemos extrapolar esta definição para a necessidade de recursos e esforços ao desempenhar algo, o que quer que seja. Eles podem estar refletidos na forma de financiamento, material, gente, receio, inteligência ou informações. Ou seja, pode vir traduzido na dificuldade de fabricar algo, encontrar algo, entender, aprender, criar, adotar ou até mesmo na dificuldade de visualizar a utilidade de algo.
Acompanhar as cadeias de valor e
custos nos leva a entender o impacto
de uma nova tecnologia. Hoje sabemos
que quando se consegue reduzir o
custo marginal para próximo a zero nos
aproximamos de uma transformação
relevante para a indústria inteira e,
consequentemente, uma mudança
de plataforma.
O microchip, por exemplo, trouxe o custo marginal da computação e de cálculos em geral para zero. A Internet garantiu que o custo marginal de distribuição de informações (bits) se tornasse zero. Mais recentemente, os LLMs estão tornando o custo marginal de criação e produção intelectual próximos de zero. Toda esta redução transforma a dinâmica de entendimento, compreensão e criação de conceitos, conhecimento, ideias e, sobretudo, paradigmas.
Essas evoluções tecnológicas que acontecem incrementalmente – de maneira estável e contínua – mudaram profundamente a forma com que a nossa sociedade produz bens e conhecimento nos últimos 50 anos. Elas nos possibilitaram sair de uma lógica de retornos decrescentes para retornos crescentes, predominantemente por causa da lógica de custo marginal. Quando o custo ou esforço de produção de uma unidade adicional de produto ou serviço é próximo de zero, a empresa garante ganhos de escala e de margens e, portanto, se beneficia de retornos crescentes.
Todas as vezes que compararmos indústrias tradicionais, que fabricam e transportam bens físicos (átomos) com indústrias de bens e serviços digitais (bits), chegaremos à eterna conclusão de que a segunda alternativa é bem mais fácil de alcançar custo marginal decrescente ou próximo de zero. Transportar e transformar bits tem a maior possibilidade e probabilidade em se obter ganhos de escala e retornos crescentes mais rapidamente.
Não posso deixar de falar sobre um fato já cotidiano de conviver com dinâmicas de retorno decrescente tanto por causa de custos crescentes de produção (escassez de recursos) quanto por limitações de economia de escala, mesmo em indústrias de bens digitais. E me aprofundarei sobre isto em uma próxima ocasião.
Há também uma terceira via. E esta é a qual eu também me interesso muito. Ao incorporar tecnologia nos processos de indústrias de bens físicos para melhorar a sua eficiência e, assim, permitir redução de complexidade de gestão, bem como monitoramento e gerenciamento em tempo real de processos e materiais, previsibilidade de demanda e de comportamento do mercado em geral, a indústria digital agrega maior assertividade estratégica e vira uma facilitadora na tomada de decisões. E é deste encontro que surgem as tech-enabled enterprises – empresas de setores tradicionais que transportam e movimentam átomos E usam tecnologia para ganhar inteligência e eficiência, se aproximando de um cenário que garante custo marginal decrescente e, voilá, permite retornos crescentes.
Um dos critérios que eu uso para analisar soluções de tecnologia é exatamente esse: entender se a startup está aproximando seus clientes e usuários a esta realidade. Ou seja, identificar quais processos aquela empresa está transformando e possibilitando retornos crescentes aos seus clientes e à sociedade em geral.
Quando eu conheci a Cayena, já havia empresas que faziam algo semelhante no mercado. O diferencial da Cayena, porém, era ser um marketplace, totalmente asset light, com a proposta de trazer eficiência tanto para os restaurantes no seu processo de compra de suprimentos quanto para o de vendas dos distribuidores de alimentos. A Cayena seria a ponte entre as partes, mas queria fazer diferente dos players já existentes.
A questão era se deveria construir um negócio techenabled para competir com players tradicionais versus construir um negócio 100% digital para alavancar players existentes. Ambas estratégias são válidas, com dinâmicas absolutamente diferentes. A escolha partiria de uma análise detalhada da cadeia de valor, dinâmica de mercado e grau de pulverização da oferta e demanda, bem como, margens, elasticidade de demanda e propensão para adoção de tecnologia. E, no final, a decisão foi construir um caminho focado somente nos bits.
Por pior que fosse a margem bruta da Cayena no início de suas operações, eu acreditei na existência de condições para alcançar custo marginal próximo de zero e “comprei” a visão dos founders de que era possível agregar valor para os dois lados ao tornar a cadeia como um todo mais eficiente, aumentando o take rate. E assim foi.
Hoje, a Cayena ajuda a cadeira de food services em diversas frentes: reduz custo de vendas dos distribuidores pela automatização do processo de compras dos restaurantes, organiza o uso de recebíveis para redução de inadimplência, melhora capital de giro de ambos os lados ofertando possibilidades de aumento de prazo de pagamentos para os restaurantes e redução do prazo de recebimento dos distribuidores, e também traz previsibilidade de demanda do consumidor final, ajudando no planejamento de ambos os lados.
Ou seja, a Cayena construiu um ecossistema que oferece aos seus clientes – das duas pontas do marketplace – a oportunidade de retornos crescentes. E como ela faz isto? Com o aumento de vendas, sem que isso signifique aumento de dívidas ou piora de capital de giro, nem aumento de fraudes ou inadimplência para os distribuidores. Para os restaurantes, comprar melhor e se beneficiar de custos reduzidos na plataforma da Cayena não representa mais despesas operacionais e nem piora do seu fluxo de caixa.
A mesma lógica pode ser extrapolada para a Estoca. Ela auxilia os e-commerces e outros tipos de negócios que precisam distribuir produtos físicos a se tornarem mais eficientes. A Estoca agrega inteligência e produtividade nas etapas de fulfillment e logística de forma totalmente asset light.
Um e-commerce normalmente nasce com a ideia de um ou vários produtos bacanas e uma forma de comunicação diferenciada com seu público (posicionamento). O foco deles normalmente está em incrementar um mix diferenciado com sua oferta para aumentar continuamente a percepção de valor dos usuários e conquistar novos públicos.
Depois que a venda é feita, essa empresa tem que garantir que o produto chegue nas mãos de seus consumidores. E essa operação de logística requer skills totalmente diferentes dos descritos anteriormente. E é aí que mora o grande perigo desta cadeia. O grande perigo ou a grande oportunidade. Há, normalmente, um aumento da complexidade nesta logística que se torna um gargalo e, portanto, um foco de retornos decrescentes – e não só pelo custo da operação, mas também pelo impacto na imagem da marca e do produto. As experiências do consumidor durante o período de espera do produto e no momento do recebimento de sua compra são extremamente relevantes e vitais na hora de comunicar sobre os vários atributos importantes para as marcas.
E é quando entra a Estoca. A sua tecnologia atende os ecommerces, galpões (responsáveis pelo fulfillment) e as transportadoras (logística). O que ela faz é eliminar todos os gargalos deste difícil processo e, com isso, devolver a possibilidade de retornos crescentes aos três integrantes da cadeia.
A integração começa já no momento em que cliente fecha o pedido. O galpão que usa Estoca consegue eficiência desde o processo de separação e empacotamento dos pedidos, garantindo um retorno maior por metro quadrado de área e por mão de obra empregada. Diminuir complexidade operacional do galpão e melhorar seu giro ao despachar os pedidos com mais rapidez são algumas das vantagens de contratar a Estoca.
Já as transportadoras têm mais visibilidade e transparência da demanda dos e-commerces e conseguem terceirizar parte do atendimento ao cliente final para a Estoca, concentrando, dessa forma, esforços no que mais importa: as suas operações logísticas. E, por sua vez, o e-commerce conta com a Estoca para melhorar a satisfação do usuário final em uma etapa do processo que ele mesmo não tem expertise para operar. Com a Estoca, a logística, de pesadelo, passa a ser sonho realizado e com final feliz.
Estoca, Cayena, Traive e Destaxa, empresas que eu tenho muito orgulho de ser investidora, têm várias coisas em comum. De todas as suas similaridades, o aspecto mais importante é a habilidade que elas tiveram de construir um ecossistema de players diversos para atuarem em conjunto e, o melhor, ao redor da plataforma tecnológica que desenvolveram. Esses players são atraídos pela visão de como a tecnologia pode ajudá-los a eliminar gargalos e possibilitar retornos crescentes. Ao fazer parte do ecossistema, eles também ajudam outros players a se beneficiarem da mesma forma, agregando valor a seus clientes diretos e à cadeia como um todo, que acaba também se tornando a maior barreira para entrada de novos concorrentes.
Agora, ao entrarmos nesta nova era com novas plataformas de AI, fica claro pra mim que se por um lado, AI diminui o custo e time-to-market de tecnologia, por outro lado, sua capacidade de processamento de informações e de extração de inteligência (insights) fortalece cadeias inteiras por privilegiar retornos crescentes seja advindo da plataforma seja de seus integrantes ao redor da mesma.
Retornos crescentes são mecanismos de feedback positivo que reforçam aquilo que obtém sucesso. Mercados, porém, que contam com esta característica para fortalecer plataformas e ecossistemas ao seu redor, não contam com equilíbrio competitivo, mas sim, instabilidade. E é aí que o jogo muda. Da forma como estão sendo construídos estes ecossistemas, estes retornos crescentes fazem com que essas empresas funcionem de maneira diferente e, assim, passam a inverter muito das nossas noções de como as corporações se estruturam e vivem. Criar ambientes plurais melhora uso de recursos e faz todos prosperarem, sem exceção.
É por esta razão que os ecossistemas são peças centrais da minha tese de investimento e quero, cada vez mais, estar perto de times capazes de vislumbrá-los e de construí-los. As conversas com empreendedores que têm incorporado em seus pensamentos os modelos mentais destes ambientes são absolutamente encantadoras e estimulantes por que nos leva para exploração de possibilidades de abundância, de ganhos mútuos e simbióticos, sem mais nada decrescente ou instável. E este é o tipo de futuro que eu invisto, acredito e considero não só possível, mas absolutamente real.