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Adoção de novas tecnologias

Hello, Hello!

Mais uma semana onde tive mais oportunidades de conversas com pessoas incríveis aqui em Stanford. Junto com o Guilherme Lichand, Sassaki e estudantes da universidade tive o privilégio de encontrar com Esteban Sosnik da Reach Capital e Ben Kornell do Common Sense Growth Fund. Ambos investidores de Venture Capital, compartilharam conosco suas perspectivas sobre as aplicações de IA na área educacional e os desafios e oportunidades que se apresentam. Compartilho aqui os pontos mais interessantes relevantes de nossa discussão e algumas conclusões que podem ser extrapoladas para outros setores e campos de atuação.
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Adoção de novas tecnologias
>>> Mudanças de comportamento

Para diversos setores, cadeias de valor e, inclusive, para a maioria das grandes corporações, a adoção de novas ferramentas e tecnologias deve estar atrelada à criação de novos processos e comportamentos que suportem essas mudanças. Esse conceito se torna ainda mais crucial quando consideramos que a velocidade de adoção de tecnologia varia dependendo do perfil de cada indivíduo. 

Surpreendentemente, todas as grandes plataformas de IA se posicionam como ferramentas de educação ou aprendizado, citando os mesmos três casos de uso: programação, geração de ideias e tutoria ou co-pilots. Dá pra imaginar que elas vão dominar o espaço educacional, o que não é surpresa dado que o Google já é a maior empresa de edtech do mundo. 

A rápida evolução das plataformas de IA, aliada à decisão de empresas como Google e OpenAI de disponibilizá-las gratuitamente, torna-se extremamente atraente para acelerar a adoção da ferramenta, especialmente no contexto da escassez de professores e da sobrecarga de trabalho que esses profissionais enfrentam no mundo todo. No entanto, esses movimentos podem distorcer o mercado e levar as escolas a adotarem soluções sub-ótimas.

 
Nós criamos tecnologias que nos transformam e acabamos transformando novamente a tecnologia e assim é o novo ciclo da vida.

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A reflexão que o setor tem feito, e que pode ser extrapolada para praticamente todas as cadeias de valor, é: essa dinâmica permitirá que empresas e startups criem produtos mais sofisticados e focados em problemas específicos, mais difíceis de resolver por generalistas? As grandes GenAIs serão alicerces para ferramentas verticais profundas? O que é necessário para isso acontecer? Que tipo de ecossistema as Big GenAIs vão criar ao seu redor? Será semelhante ao que o Google, Microsoft e AWS criaram na “geração” passada, pré AI?*

*Quem quiser mergulhar em aspectos mais técnicos da construção de estratégias de produto e nas camadas das plataformas pelas Big Techs, esse post do Ben Thompson é bem ilustrativo.

Thin wrapper & Thick wrapper

Atualmente, presenciamos o surgimento de um grande conjunto de ferramentas muito simples ou com aplicações superficiais, construídas em cima das GenAIs. Isso causa bastante ruído tanto para investidores quanto para quem procura entender as alternativas e o valor agregado de cada uma.

Para todos os aspectos que envolvem IA, a palavra-chave é defensibilidade. Tanto Ben quanto Esteban usaram a expressão “thin wrapper e thick wrapper” que define a diferença entre as ferramentas que criam uma camada fina de experiência do usuário ou interface em cima das GenAIs(thin wrapper) e aquelas que realmente trazem e aplicam conhecimento técnico profundo sobre um problema e persona em um produto com usabilidade especial e focada nesse usuário (thick wrapper).

Ou seja, a defensibilidade está na construção de uma solução que, por causa da profundidade, conhecimento técnico e intimidade com a persona, torna o produto ou proposta de valor irreplicável. Normalmente, quem compra tecnologia não busca IA em si, mas sim, uma ferramenta que resolva seu problema. Este cliente avaliará como a ferramenta aborda e resolve problemas específicos, qual é o workflow que está incorporado nele e se a experiência do usuário é 10x melhor do que as ferramentas existentes.

 
 
A partir deste conceito, então, como a Reach Capital e o Commom Sense escolhem onde investir?

Ambos os fundos possuem processos semelhantes de mapeamento do mercado e compreensão do posicionamento de cada startup. A Reach faz o mapeamento de acordo com a jornada do aluno – da primeira infância ao futuro do trabalho – e acessa a maturidade das ferramentas e mercados em geral. Já a Common Sense mapeia as startups que se posicionam de acordo com os desafios e dores de cada segmento, entende o resultado desejado para essas ferramentas e busca as melhores soluções para investir e recomendar para escolas e professores.

Atualmente, existem 5 segmentos interessantes: (i) formação e treinamento de professores, (ii) suporte ao processo educacional – grade de aulas, exercícios e propostas, acompanhamento de resultados e feedbacks aos alunos, entre outros, (iii) ferramenta de dados e mapeamento de dificuldades e erros comuns no processo de aprendizagem, (iv) engajamento das famílias e (v) segurança da informação e da tecnologia em geral.

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Nesse início de ciclo de investimento em AI, as ferramentas mais transformadoras são as que se propõem a formar profissionais, ajudá-los no desempenho mais eficiente de suas funções no dia-a-dia e em tomada de decisões. Essas ferramentas auxiliam a materializar aspirações importantes relacionadas à inteligência artificial (IA), como personalizar e adaptar conteúdo, preparar relatórios e apresentações e fornecer feedback de forma mais eficiente e em larga escala, além de trazer dados, insights e ferramentas para tomada de decisões.

 
 
 
E, mais uma vez, os desafios envolvem adoção de tecnologia e mudança de comportamento

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Foi refletindo sobre essas questões que Ben Kornell trouxe uma informação bastante relevante: todo o conteúdo produzido pela escola e corpo docente – informações expostas nas lousas, textos e apresentações, avaliações, notas, frequência – são considerados dados estruturados e representam só 5% de todas as informações que circulam pela escola. Como capturar e analisar os 95% dos dados desestruturados (invisíveis), produzidos durante as atividades, discussões, trocas entre alunos e professores, lições de casa, etc?

Essa questão vai além da sala de aula e se estende ao mundo corporativo, onde empresas também lutam para gerenciar a vasta quantidade de dados desestruturados que permeiam seus processos. O IDC tem uma pesquisa que mostra que 90% dos dados corporativos são desestruturados e apenas 26% das empresas utilizam métodos automatizados para analisar seu conteúdo. 

E por causa da TáOn, todo um ecossistema se abre. Ao trazer uma alternativa para demanda reprimida por conectividade e inclusão digital, a empresa possibilita, como consequência imediata, maior acesso a produtos de educação que não chegam a essas pessoas por causa de todo o contexto atual mencionado acima.

O que mais surpreende: nos Estados Unidos, um colaborador usa, em média, 37 ferramentas de software para apoiar e trazer eficiência para seus trabalhos diários. Tudo isso fica inacessível aos times de tecnologia uma vez que 97% dessas ferramentas são compradas pelos próprios departamentos e equipes.

As ferramentas que conseguirem coletar, organizar e classificar tudo isso, e extrair insights para melhorar a performance de usuários e profissionais em geral, estarão no caminho certo. E, mais uma vez, os desafios envolvem adoção de tecnologia e mudança de comportamento (integração e colaboração entre as áreas e cultura data-driven).

No Brasil, duas empresas que eu investi trouxeram soluções a partir destes dados estruturados. A Movva é pioneira no setor de educação ao coletar dados de engajamento de alunos com instituições de ensino superior e criar réguas de comunicação para alunos como prevenção de evasão, além de trabalhar o marketing, personalizando campanhas. Veja os primeiros casos de uso, ainda apenas com dados estruturados. E a Traive também construiu um score de crédito para recebíveis agrícolas através do cruzamento destes dados (coletados através da integração com ERPs das revendas com os disponíveis na web como clima, preço de commodities, etc).

 
 
 
 
As possibilidades advindas do desenvolvimento das plataformas e tecnologias de IA são ao mesmo tempo incríveis e preocupantes.

A maioria das pessoas com quem conversei, assim como nas aulas e palestras sobre IA aqui em Stanford, em algum momento, traz reflexões e preocupações profundas sobre o que estamos vivendo e como estamos escrevendo o futuro.

Essa conversa com Ben e Esteban não foi diferente, principalmente quando falamos sobre as plataformas Omni Modais – sistemas de IA capazes de processar e integrar dados de múltiplas modalidades ou fontes, incluindo texto, imagens, áudio, vídeo e outros inputs sensoriais com o objetivo de entender e gerar respostas semelhantes às humanas.

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Ben Kornell expressou sua preocupação sobre a perspectiva de que os LLMs avançarão para comunicação e desenvolvimento de linguagem a partir de vídeo. À medida que avançamos para vídeo, veremos as plataformas criando conteúdo e se comunicando de formas diferentes, criando novos casos de uso para crianças em idade ainda mais novas, pré-alfabetização, ou que não conseguem ler – neurodivergentes ou com dificuldades de leitura e compreensão de textos.

As possibilidades advindas do desenvolvimento das plataformas e tecnologias de IA são ao mesmo tempo incríveis e preocupantes. Como sociedade, teremos que discutir intensamente sobre o papel de IA em nossas vidas em que tange (i) o acesso das crianças à IA, (ii) a autonomia da tecnologia em áreas como direito, transporte, saúde, segurança pública e defesa (iii) potencial impacto no mercado de trabalho e (iv) as mudanças comportamentais que a IA, e todo o contexto ao redor, pode trazer.

Todas essas questões não são só intelectualmente estimulantes, elas possuem uma dimensão moral e ética, devido ao impacto de cada escolha na vida de todos nós. Na minha opinião, junto com as questões climáticas, esse é o assunto mais relevante dessa geração.

Vamos juntos?

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